Esta é uma declaração de amor a Alberto Caeiro, o primeiro; e a Manoel de Barros, o último. Porque os amores são assim: restam aqueles que inauguram o curso de um rio e aqueles que Vinicius definiria serem os únicos que ficam. Faz anos: fui à livraria comprar o então último livro de Barros. ― Queria o “Livro das Ignoranças”. A vendedora corrigiu-me: ― Não é ignorança, é ig-no-RÂN-CIA. Claro, ela conhecia muito bem a matéria dos produtos que vendia: não se pode trabalhar em uma livraria e não ter certa cultura. Digamos, porém, que o meu amor dava-me asas para correr à livraria mais próxima de casa (nem a maior, nem a mais abastecida), chegando antes que a moça pudesse ver os últimos lançamentos e constatar que nada havia de estranho no meu pedido. A “ignorança” de Manoel de Barros é a ignorância no momento em que ainda ignora si mesma. É ignorância em estado puro. Ela me carrega para Alberto Caeiro, como se eu fosse Dona Flor. É inevitável. Caeiro dizia: “a única inocência é não pensar”...
Amor pela língua portuguesa