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Mostrando postagens de novembro, 2014

UMA GOROROBA LINGUÍSTICA

Quem é que não tem uma gororoba inconfessável da qual não abre mão? Gororoba é uma das melhores coisas da vida, é segredo que só se compartilha com os mais íntimos ou que permanece como uma lembrança boa da infância. Por mais deliciosa que seja, a gente não serve gororoba em dia de festa e evita fazer misturas constrangedoras em situações públicas. Com a língua não é diferente: há certas gororobas linguísticas deliciosas, mas não dá para usar o tempo todo e em qualquer lugar. Não é puxão de orelha nem moralismo, é aviso de amiga. Quando vejo uma gororoba linguística saindo da boca na hora errada, eu sempre penso: mas uma pessoa tão bem apresentada, quem diria... foi abrir a boca para estragar tudo. É chato falar disso, pois gororoba, como disse, é uma gostosura. Na língua, a gororoba pode ser um desabafo, um suspiro, uma gíria, um bocejo, um erro de concordância, um vício de linguagem. No Sul do Brasil, por exemplo, é proibido fazer a concordância entre a segunda pessoa e o verbo

PETROLÃO E OUTROS -ÕES DEPRECIATIVOS DA LÍNGUA

Já tive oportunidade de comentar aqui no blog que o sufixo -ÃO não é utilizado apenas para descrever algo grande, mas para indicar um termo que assume, com o sufixo, um valor negativo. Os sufixos usados para o diminutivo e para o aumentativo são peculiares. Nas gramáticas mais tradicionais, são classificados como flexões do substantivo. No entanto, há uma discussão já bastante consolidada sobre isso: muitos linguistas defendem que os diminutivos e aumentativos são exemplos de derivação, pois não são alterações obrigatórias, como no caso das flexões, que precisam obrigatoriamente ser respeitadas para que não haja erro gramatical. Portanto, o primeiro aspecto interessante a notar é este: os sufixos usados para o diminutivo e para o aumentativo, entrando na categoria das derivações, são um fator de vitalidade para a língua. Embora sejam sufixos que não mudam, a possibilidade de serem anexados a palavras que não os empregavam tornam potencialmente infinitas as possibilidades de criação.

NOSSA, QUE BANDEIRA!

Brasileiro adora uma festa, imaginem se não teríamos no nosso calendário oficial o dia da bandeira, com direito a cerimônia e tudo! Claro que temos! Aliás, para o Dia da Bandeira, 19 de Novembro, temos hino específico, escrito pelo Príncipe dos poetas, ou seja, Olavo Bilac - o mesmo que compôs o poema "Língua Portuguesa", eternizando o nosso idioma como "última flor do Lácio". Mas essa já é outra história. Bandeira é uma das tantas palavras em português que se caracterizam pela polissemia. Já comentei isso em outros artigos: considero a polissemia um dos elementos característicos da nossa língua (aconselho escrever "polissemia" na janela de busca do blog para listar todos os artigos que mencionam esse tema). Resumo o conceito: a polissemia, por um lado, é uma riqueza, pois revela capacidade de dar sentidos diferentes para um mesmo termo, mas é também um fator de dificuldade para o falante, porque nem sempre temos domínio de todos os sentidos de uma pala

HEIN?

Eu adoro as interjeições. Pobre classe gramatical, especialmente quando é usada pelos jovens. Mas quando empregada por adultos, especialmente os chamados ilustres e respeitáveis, a interjeição enche o peito, vaidosa do papel que representa no teatro das figuras de linguagem. Basta pronunciar um "hein" para que um diálogo mude totalmente o seu curso. O "hein" pode significar dúvida, descrédito, ironia, malícia, inveja, aversão, corroboração. "Hein" pode ser um mundo obscuro: um terreno onde prevalece a interpretação. E quando interpretamos, sabe-se, os limites são muito subjetivos. Eu fico imaginando um diálogo à maneira de Esperando Godot, no qual um dos interlocutores repete continuamente a interjeição "hein". O cara diz nada e diz tudo. Enquanto isso, o mundo. Mas "hein" tem algo mais que as virtudes semânticas. Possui também a beleza local da nossa fonética: não bastasse ser uma típica palavra nasalizada, também contém a ditongaç