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DE PEDRAS, DE PALAVRAS, DE TEMPLOS

"Há entre as pedras
e as almas
afinidades
tão raras
como vou dizer?"

Esses versos são um trecho da canção Granito, composta por João Bosco e Antônio Cícero. Fazia tempo que queria falar de pedras e de palavras, os versos ofereceram a deixa perfeita.


Cada vez que penso no que somos capazes de construir e de destruir com as pedras, acho que daria para escrever a vida toda. Se penso que um dos primeiros materiais usados para fixar a escrita foi a pedra, a mente viaja pela história. Se lembro que há mais afinidades entre as pedras e as palavras do que as aparências podem sugerir... vou contar para vocês:

A viagem começa por uma pedra preciosa, o lápis-lazúli. Trata-se de uma pedra conhecida desde a antiguidade, usada para vários fins, inclusive para distinguir  a dignidade real dos governantes. Moída, servia para fazer uma tinta azul: de fato, a palavra azul vem de lazúli, que em persa significa exatamente azul. Era um tipo de coloração de enorme valor durante a Idade Média, comparável ao ouro, devido à sua resistência nos afrescos e, provavelmente, por ser extraído apenas no Afeganistão naquela época. Exemplo magistral do seu uso pode ser visto em Pádua, na Cappella degli Scrovegni, afrescada por Giotto.

Lápis, em latim, significa pedra. Por isso lazúli é um lápis: a pedra azul. Mas sendo também, em forma de pó, uma tinta, o lápis, instrumento de escrita, também deriva dessa palavra, embora seja composto principalmente por grafite.

Vários verbos derivam de lápis, o termo latim. O verbo lapidar, facetar pedras preciosas, vem daí. Mas lapidar, sinônimo de delapidar, apredrejar, possui a mesma origem. Delapidar, por sua vez, pode também significar gastar muito, arruinar um patrimônio. Lápide é outro termo derivado de lápis: é a pedra que cobre a sepultura, quem sabe de alguém que delapidou o patrimônio formado por pedras lapidadas...

Há, ainda, a relação entre lápis, elemento de formação de palavras relacionado ao termo pedra, e lápis como objeto para escrever. É uma triste ironia pensar que com a escrita podemos promover a lapidação simbólica das pessoas, podemos arruinar reputações, podemos perseguir e linchar.

Resta, por fim, uma nota positiva. Pedras e lápis: servem também para construir e para amar. Como um poema, como uma canção:

"Mas o templo eu faria assim
puro de uma pedra bruta
de uma fruta bem calada
diminuta furta-cor
de granito assim a cintilar
no seu olhar."

Penso nas pedras, no amor, nas palavras. De repente, uma sintetiza todas: Taj Mahal.

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