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CINCO MANEIRAS GARANTIDAS DE ARRUINAR UM TEXTO LITERÁRIO

Recentemente falei das utilidades da literatura. Hoje gostaria de compartilhar com os leitores cinco modos eficazes para destruir um texto literário (embora seja um fato geralmente indesejado, especialmente se o agente da destruição for um professor).

LEIA O TEXTO EM VOZ ALTA
A poesia tem uma regra: ela precisa ser recitada. Não é possível fruir plenamente a sua poeticidade sem a dimensão material gerada pela vibração das ondas sonoras no espaço. Eu gosto de chamar a atenção para isso, porque a literatura, quando recitada, interage com materiais plásticos (ou seja, deformáveis), especialmente o ar, mas não só. Interage com os tímpanos. Assim como a pintura modifica-se de acordo com a frequência de luz que incide sobre o quadro e com a nossa capacidade de visão.
Dá para perceber que ler mal um texto é um crime! Em vez de harmonias, a leitura em voz alta pode gerar dissonâncias e criar um efeito indesejado. Portanto, todo cuidado é pouco, pois os nossos sentidos estão ligados às emoções: não basta a racionalização para um texto entrar pelo tímpano e cumprir o seu papel plenamente. Ele tem que vibrar e mexer com a gente.
Se não for um bom orador, um vídeo pode ser a salvação. Ou uma gravação, Ou uma versão musicada.
PERGUNTE O QUE O LEITOR ACHA QUE O AUTOR QUIS DIZER
Essa é muito engraçada. Quando vai ao cinema, a gente pergunta: e daí, gostou do filme? Nunca vi alguém perguntar na saída da sala cinematográfica: o que você acha que o Carlos Diegues quis dizer com o filme? Mas com os livros a gente faz isso. E faz não com o leitor culto, realmente interessado na crítica: com um leitor experiente isso teria sentido. O problema é que se faz isso com o leitor médio ou iniciante, que ainda está na fase do gostei-não-gostei, sem os instrumentos que a crítica dá com o tempo e com muito estudo.
FAÇA ANÁLISE SINTÁTICA DE TRECHOS DA OBRA
Se o objetivo é destruir, esta é uma das técnicas mais eficientes. É como se você estivesse entrando em um cruzeiro e em vez de acompanhar as atrações e as etapas da viagem, descesse à casa de máquinas do navio para verificar as certificações de conformidade, a validade dos extintores de incêndio, o funcionamento do radar e o contrato de trabalho dos marinheiros e assistentes.
PEÇA PARA O LEITOR IMAGINAR COMO É O FIM DA HISTÓRIA
Essa é uma estratégia que agrada aos sádicos. Quando o leitor está no bom da história, a pessoa interrompe e pede para ele imaginar o resto. Justamente quando ele, que já vinha imaginando o cenário, imaginando a cara da personagem, imaginando a época, e não vê a hora de ver o fim que as personagens vão ter... vem alguém estragar tudo e pedir que ele imagine como a história acaba! Além de ser desmancha-prazeres, é bem provável que com um pedido desses o pobre leitor sinta-se extremamente frustrado ao perceber que o seu talento para a escrita está bem aquém do talento de um escritor profissional.
ESCOLHA AS OBRAS SEGUINDO UM PROGRAMA
Esta dica vale para os professores. O seu objetivo é falar de Romantismo? Escolha uma obra e mande todo mundo ler. Não importa que as pessoas tenham gostos diferentes ou que elementos do Romantismo possam ser encontrados em obras de outros períodos. Para garantir que a festa vai acabar mal, utilize na discussão da obra todas as dicas anteriores. E humilhe o leitor que eventualmente não se identificar com o texto. Ora, se a maioria gostou, como é que um ou dois podem não gostar? E mesmo que não goste: diga que é preciso ler porque isso é cultura. Coloque na cabeça das pessoas que a cultura exige sacrifícios e demonstre a sua tese comparando os lixos culturais que os jovens adoram com a verdadeira e excelsa arte. Destruição certa e total.

Será que alguém já passou por alguma dessas situações? Espero que não. Espero que fique por aqui a brincadeira e que as estratégias de incentivo à leitura estejam de vento em popa! Mas ficaria contente se alguém compartilhasse a sua experiência. Corroborando ou acrescentando casos, sejam positivos, sejam negativos. Apesar dos avanços, sempre fico com alguma desconfiança em relação à experiência das pessoas nas suas histórias de leitura, pois quando lemos estatísticas de livros lidos, os dados não são animadores. Há algo errado na história...

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