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A ARTE DE PERGUNTAR

Não acredito! Este é um tema que eu adoro, como é que nunca dediquei um artigo à questão?

O assunto é: a arte de fazer perguntas.

Eu sempre fui muito tagarela e despachada. E sempre achei que perguntar não ofende. Que quem tem boca vai a Roma... Eu era o público perfeito para qualquer conferencista. Quando caía aquele silêncio mortal na plateia, eu era aquela que fazia uma pergunta para alívio geral dos autores. Mas é claro que fazer pergunta não é encher linguiça. Há dois tipos odiados nas plateias: aquele se levanta para fazer um comentário que se transforma em conferência-bis e aquele que adora polêmica e é chamado carinhosamente de seminarkiller.
Uma pergunta bem feita é outra coisa: não só abre a discussão, como evidencia os aspectos mais salientes no discurso do interlocutor. Aprender a fazer perguntas é uma questão de língua e de educação.

A questão educativa:

A nossa experiência formal com os questionamentos inicia com a escola, não somente nas situações cotidianas na sala de aula, mas também nos momentos de avaliação. O primeiro que deve ser um bom perguntador e dar o bom exemplo é o professor. Nesse sentido, é bom lembrar que o professor não deve fazer perguntas apenas para confirmar o que disse, mas para saber se o aluno aprendeu a pensar. Perguntas que se limitem a verificar conteúdos não dão conta do potencial, não transforma o momento da avaliação em uma experiência significativa de balanço da aprendizagem e de teste do potencial. Quando a pergunta limita-se ao teste de memória, o interlocutor percebe a encenação. Há fileiras e fileiras de pessoas que na escola aprendem a lidar com essa situação: aprendem a malandragem, aprendem a se dar bem usando apenas capacidades que qualquer processador é capaz de fazer por poucos níqueis, sem precisar gastar o cérebro. Infelizmente, isso ainda funciona porque a educação, muitas vezes, ainda conserva resquícios de enciclopedismo no mau sentido do termo. É uma educação que forma "apenas na forma", pouco na substância. Forma atores que repetem a lição, mas interpretam o texto sem colocar a alma.

A vida se encarrega de dar as lições que realmente contam para todo mundo. Mas se na escola a gente aprende a fazer esse tipo de teatro barato, a vida pode ser mais complicada quando nos pedem coerência, sinceridade, personalidade, caráter. Essas coisinhas que com a decoreba não entram na veia.

A questão linguística:

Ao aprender a fazer perguntas, a gente também aprende a aprender. A minha técnica pessoal é aquela de sintetizar em notas breves ou mentalmente as passagens mais significativas do discurso do interlocutor. Esse processo, necessário para elaborar a pergunta, permite que tenhamos uma ideia geral do que fomos capazes de capturar no discurso do outro. E geralmente a pergunta que parte da síntese é algo que permanece na memória, porque já sofreu uma nossa elaboração inicial.
Uma pergunta desse tipo também desperta muito interesse para o interlocutor. Esse aspecto interpessoal não deve ser desconsiderado: saber que foi ouvido com atenção, inclina o interlocutor a responder com generosidade, a ampliar a questão. Mas é preciso ser muito sintético mesmo, a premissa da pergunta não deve ser outra conferência.
Finalmente, as perguntas devem ser brevíssimas. A tarefa do perguntador é abrir uma nova oportunidade para aprofundar o tema apresentado.
Quando elaboro uma pergunta, costumo abrir para uma comparação, evocar o contrário, pedir uma perífrase, solicitar um exemplo, uma especificação ou uma generalização.
Trata-se de um exercício mental que não é simples e automático no início, mas é gratificante ao longo do tempo. Aplica-se não apenas às situações formais no ambiente escolar e profissional, mas é uma ferramenta poderosa de comunicação, útil na vida pessoal e no cotidiano.

Um cuidado importante, porém, é necessário: quando entramos em aspectos pessoais, convém avaliar o interlocutor, a sua cultura, o seu temperamento. A arte de fazer perguntas não tem caráter universal, para algumas pessoas e algumas culturas certos tipos de pergunta não funcionam e são até ofensivas. Também nisso, exercitar-se na arte de perguntar é útil, porque exige do perguntador aquela sensibilidade empática que permite que a pergunta se transforme realmente em motor do diálogo e do conhecimento recíproco.

Nossa, a questão das perguntas é tão longa! É tão importante!

Mas vivemos na era das declarações, do falar pelos cotovelos e não estar nem aí para o que os outros pensam do que nós pensamos. E também vivemos, como reação ao monólogo virtual que permeia o cotidiano, a era das perguntas retóricas e irônicas. Perguntas que não ajudam a estreitar laços, que deixa cada macaco no seu galho.

Não somos um exército de escritores de um leitor ideal. Somos pessoas que precisam de laços. Por isso precisamos de perguntas. E precisamos nos questionar sobre como encaramos esse aspecto da comunicação.

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