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ERRO OU LICENÇA?

Hoje o blog copia Facebook. Trata-se de uma reflexão que compartilhei com o grupo "Última Flor do Lácio", mas que é bastante pertinente para os objetivos do Palavras Debulhadas. Ei-la:
Eu costumo brincar com meus alunos: quando o aluno viola uma regra da língua, o professor diz que é erro. Quando o poeta erra, o professor diz que é licença poética. Há vários casos: o do Luis Fernando Verissimo, que deixa qualquer professor em maus lençóis com a abertura da sua crônica "Sumido": "Me disseram que você anda sumido. É mesmo, fazia tempo que não me via". Claro que o objetivo do autor é reproduzir o uso coloquial da língua, é uma licença poética, ora! Também tem o caso de Vinicius de Moraes com o seu célebre "Soneto da Fidelidade": "Que eu possa me dizer do amor (que tive) / Que não seja imortal, posto que é chama / Mas que seja infinito enquanto dure". O erro está lá... aliás, a licença poética: para os comuns mortais "posto que" significa "embora", "ainda que", não significa "dado que" ou "visto que".
Para completar o trio, deixo a vocês o Ferreira Gullar, recitando um trecho do seu "Poema Sujo", um marco da poesia brasileira do século XX. Intenso, visceral... lá pelas tantas eu ouço o poeta: "explodo". Como? O verbo explodir não existe na primeira pessoa do presente do indicativo! É um verbo defectivo! Não satisfeita, ouço novamente: "explodo".
Eu imagino o povo (que conjuga até o que não existe) e ameaça: "eu estou explodindo, eu vou explodir, olha que eu... explodo!". O povo tem razão, está aí o Gullar que registra e marca com a sua licença a fronteira entre o que é aceito e o que está destinado a ficar clandestino.
Vejam o video e leiam o trecho para responder à questão: afinal, "explodo" é erro ou licença poética?

http://www.youtube.com/watch?v=Vp6bg4PZTe8&feature=relmfu 

"minha cidade doída
Me reflito em suas águas
recolhidas:
no copo
d’água
no pote d’água
na tina d’água
no banho nu no banheiro
vestido com as roupas
de tuas águas
que logo me despem e descem
diligentes para o ralo
como se de antemão soubessem
para onde ir
Para onde
foram essas águas
de tantos banhos de tarde?
Rolamos com aquelas tardes
no ralo do esgoto
e rolo eu
agora
no abismo dos cheiros
que se desatam na minha
carne na tua, cidade
que me envenenas de ti,
que me arrastas pela treva
me atordoas de jasmim
que de saliva me molhas me atochas
num cu
rijo me fazes
delirar me sujas
de merda e explodo o meu sonho
em merda."

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