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O MAIS-QUE-PERFEITO SOLTA O VERBO


Ele nasceu para ser o orgulho da família: frequentar poesias, discursos pomposos, bulas, crônicas de reais estirpes, tratados. Assim reza a norma, que os amigos da gramática continuam a pregar, para maior fama do pretérito mais-que-perfeito.
O que pouca gente fala é que o varão tem uma queda pelas rodas populares, impondo-se e tirando o lugar do imperfeito do subjuntivo. Pudera! O imperfeito do subjuntivo aproxima-se com ar submisso de quem está sempre à espera de condições favoráveis para entrar em cena... o mais-que-perfeito não perde tempo e toma o seu lugar. “Quem me dera ser como você” – ensina o mais-que-perfeito ao parceiro subjuntivo – “É desse modo que fala o povo que me ama” – completa com orgulho indicativo. A plateia vibra e repete, carrega o mais-que-perfeito nos braços sem saber quem está colocando no trono. E enebriado pela sua popularidade, o mais-que-perfeito volta para o seio da família, aos textos solenes, e espanta-se quando o leitor considera-o pedante e esnobe.
Mais que irritado com a incompreensão alheia o mais-que-perfeito sente-se desolado e põe em mãos divinas o seu destino: “prouvera a Deus...”. O imperfeito do subjuntivo ri na surdina e aguarda, como sempre, outra oportunidade para si.

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