Brasileiro
que fala bem mais cedo ou mais tarde desliza na voz passiva. Não que se trate
de erro gramatical: pode ser exagero, pode ser descuido, pode ser uma pequena
maldade. A passiva é a forma da dissimulação estudada, das pequenas
deselegâncias, da malandragem e do pedantismo. É a luva perfeita para bater na
cara dos resignados. É o metro que distancia e justifica a impessoalidade do
jornalismo que aposta nos fatos e não nas fontes.
Nada
contra, o seu uso é legítimo e aprovado pelas normas da língua. Ai de mim,
atacar uma passiva! Até gosto, como quem gosta de feijão por força do hábito.
Mas é preciso lembrar que nem todo mundo comunica do mesmo mesmo modo: passivo.
E mesmo no nosso nobre idioma há quem defenda o uso da voz ativa, direta, sem
rodeios, sem elementos ocultos.
Seguem três
casos em que a passiva aparece com frequência, com comentário e juízo de valor:
PARA DAR UMA NOTÍCIA DESAGRADÁVEL
É chato, mas às vezes o cartão de crédito fica
bloqueado porque estouramos o limite, porque não está habilitado em certas
áreas, porque a linha telefônica não funciona. O comerciante não vai admitir
nada disso, porque é constrangedor, então pode simplesmente comunicar:
“O seu pedido não pôde ser processado”
Quem é que não processou o pedido do cliente?
Fica no ar, mas para bom enetendedor meia palavra basta: é melhor encontrar
outro modo de pagar a conta.
Também é muito triste dar a notícia de uma morte, especialmente quando ainda estão em curso as investigações sobre o homicida. É o típico caso das manchetes de jornal:
“Estudantes são baleados durante protesto”
PARA OCULTAR O AUTOR DA AÇÃO
É o modo usado por quem tem rabo de palha.
Exemplo: quando uma lei é aprovada, mas ninguém quer assumir que contribuiu
para a sua aprovação.
“O aumento do IPI foi aprovado ontem no Congresso”
PARA TIRAR PROVEITO DA AÇÃO ALHEIA
Esse sem dúvida é o modo mais infame de uso da
voz passiva. Infelizmente é mais comum do que se imagina. É o caso, por
exemplo, do candidato que pega carona nas obras realizadas pelo adversário para
alavancar a própria condidatura:
“Foram construídas centenas de salas de aulas, e construiremos ainda mais se formos eleitos”
Ou o caso do chefe que fala em nome da equipe:
“O trabalho foi entregue em prazo recorde”
Quando pensar de modo passivo, cuide se não
está usando o Lado B da estrutura. A passiva pode ser muito delicada se bem
usada, mas basta pouco para revelar o seu lado pior.
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