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Mostrando postagens de outubro, 2017

O "S" DE NÃO

Alguém duvida que a gente diga "não" respondendo que "sim"? Acredite. Isso é mais frequente e mais sutil do que a gente possa imaginar. É uma questão cultural: o maior empecilho para a gente pronunciar aquela palavra negativa, que custa a sair dos lábios, é o nosso problema em ferir os ouvidos e as suscetibilidades alheias. A gente acha que "não" ofende: estamos errados. O "não" esclarece, o "sim" aumenta a hipocrisia. E não basta uma aulinha de língua, de uso dos advérbios, de coerência de texto: a cultura se aninha e cresce com a gente. Destruir um hábito, ou um vício, é uma batalha quixotesca. Em vez de dizer não, a gente prefere prometer e descumprir. Melhor dar uma desculpa de última hora do que acabar com a expectativa no nascedouro. Em vez de usar o não, a gente opta por mentir. Isso é tão comum, que, quando as pessoas dizem algo, sempre há um interlocutor pronto para perguntar: "o que você quer dizer com isso?", co...

A arte de lidar com nós

A partir dos quatro anos, começamos aprender a dar nós. A habilidade se desenvolve paralelamente à capacidade de unir sons, juntar sílabas, começar a aprender a escrever. É uma etapa fascinante, cheia de descobertas. Por volta de sete anos a criança já é capaz de amarrar os sapatos e correr para brincar, sem ajuda de ninguém. Já com a língua o caminho é bem mais longo. Não basta aprender a dar um nó no texto. É preciso aprender a técnica de soltar os nós. Mas a mais fascinante é a habilidade de lidar com os nós, apertando, afrouxando, mas sem se desfazer deles. Os nós são os pontos de tensão, onde o autor exerce a correta pressão sobre o leitor. Se puxa demais, o leitor desiste. Se deixa muito frouxo, o leitor escapa. Os pontos de tensão em um texto marcam o ritmo, como se o texto fosse uma verdadeira partitura. A tensão aumenta e cai lenta ou bruscamente. Em certos momentos o ritmo segue de forma linear, para o texto fluir e dar segurança ao leitor. Mas é fundamental ter clara a noç...

A crítica e a opinião

A crítica está em crise. Problema? Não. O problema é a crítica não estar em crise. Crise é um momento importante, de mudança de uma situação, é uma ação que estabelece a decisão. Crise é um termo usado em medicina e em economia. Na linguagem cotidiana é usado como se fosse sinônimo de problema, mas não é. A crise é o momento da definição da solução, boa ou má que seja. De todo modo, a crise da crítica é também um problema. A crise cotidiana da crítica é ser confundida com opinião e não ter instrumentos suficientemente prosaicos para rebater opiniões reles. A boa crítica vale-se de linguagem própria, de instrumentos adequados, que os especialistas conhecem e nos quais os não especialistas deveriam confiar mais. É como quando a gente vai ao médico: se não quer aceitar o conselho profissional, pode acreditar no palpite. Mas não venham dizer que os dois pareceres têm o mesmo valor! Por exemplo, quando um crítico diz: "isto é um museu" ou "isto não é um museu, é um presídi...