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Mostrando postagens de julho, 2013

HÁ TRUQUES E TRUQUES

Antonio Candido que me perdoe, mas malandragem não é fundamental. Admiro o grande mestre, que soube descrever a malandragem como um dos traços distintivos da cultura brasileira, mas, sabe como é, em país de malandro, toma-se por receita o que é diagnóstico! Na realidade, Candido nunca fez apologia da malandragem: apenas reconheceu e explicou a peculiaridade da literatura de Manuel Antônio de Almeida e de Mário de Andrade. São os maus leitores que acharam que a malandragem é uma gracinha e um direito universal dentro da nação brasileira. Estou disposta a pagar novamente o ônus de ser considerada moralista, o que posso fazer? Chego à conclusão de que sou mesmo assim. Mas não demonizo nada e ninguém: sei apreciar e rir das peripécias do Sargento de Milícias, sei ver a alegoria de um Macunaíma, mas isso não significa que anulei o meu discernimento. Macunaíma, é sempre bom lembrar, é o herói sem nenhum caráter: se a literatura tem uma função social, Mário de Andrade deixou ao leitor um p

POESIA PARA QUÊ?

Hoje a poesia está para a língua como a arte abstrata está para a pintura. Para catalogá-la, já não bastam os elementos formais como rima, métrica, musicalidade, figuras de linguagem. O prosaico urbano invadiu o espaço poético, como outrora invadira o cotidiano (suponho) o bucolismo, mas a fúria prosaica não respeita os cânones líricos do passado. A anti-lírica e a falta de lirismo são o reverso da medalha e querem o seu espaço de negação lírica legitimado. Os poetweets e os aforismos poéticos desafiam a síntese. Romances em versos (recentemente passei os olhos por um, escrito por um jovem escritor italiano) apostam suas fichas em provocações nostálgicas. A música popular há muito tempo virou objeto de considerações acadêmicas, ganhando também a sua pequena glória literária. Vão-se os tempos em que os mais tradicionalistas contestavam a presença de Paulinho da Viola no júri de um prêmio literário. E Chico Buarque já ganhou todos os prêmios do nosso panteão. E apesar de toda a conf

CONSIDERAÇÕES SOBRE O NADA

Se alguém achava que o niilismo é coisa do longínquo século XX, leia a Encíclica do Papa Francisco. Mas o meu assunto é língua portuguesa, então, vamos lá: "Niilismo"  vem do latim "nihil", quer dizer, nada. Em italiano escreve-se "nichilismo" (a pronúncia correta é niquilismo): em português temos " aniquilar ", uma palavra proveniente do baixo latim "annichilare", que por uma série de transformações também possui suas raízes em "nihil". "Nada" , em vez, vem da expressão latina "res nata", "coisa nascida". Para entender como isso transformou-se em "nada", é preciso saber que na expressão "res nata" estava implícita uma elipse, ou seja, estava omitida a palavra "não", "res nata", potanto, era "o que não havia", era "nada". Em relação ao aspecto fonético é interessante notar a alternância d/t, que se verifica em outras palavras da líng