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Mostrando postagens de novembro, 2012

COMO VAI, SENHOR MONTAIGNE?

Caro Montaigne, os canibais usam calças há muito tempo. Aprenderam a língua do homem branco e no próximo ano poderão festejar os vinte e cinco anos de status de cidadão com plenos direitos. Sim, hoje os canibais podem exercer plenamente, usando a língua do homem branco, o direito de reclamar suas terras usurpadas. Hoje eles são livres para dizer que querem continuar vivendo onde sempre viveram. Hoje eles vivem em uma democracia. Hoje eles são minoria e, visto que vivem em uma democracia, há muito mais gente (que não conhece a sua língua e muito menos os seus costumes)  que acha que deslocar uns poucos canibais de sua casa é só uma questão de mudança de endereço. Afinal, caro Montaigne, esses milhões de pessoas que pesam na balança da democracia jamais seriam deslocados de suas casas, porque mudar o endereço de tanta gente seria numericamente mais complicado e oneroso do que mudar o domicílio da minoria. Os canibais continuam vivendo em uma situação de relativa pobreza, mas são livres;

A REPÚBLICA E A ARTE DE SER COPISTA

Viva a República! Viva a "res publica", viva a coisa pública! Palmas para os que honram a república. Pensemos nessa jovem senhora República brasileira e em um dos seus melhores e mais atuais cronistas: o grande Machado de Assis. Imitar a arte dos grandes é já um grande trabalho. Machado, grande leitor e conhecedor de outras culturas, soube aproveitar as lições do passado sem fazer manifestos e alardes como os modernistas, mas o tempo confirma para mim que ele é o mais límpido, mais moderno e contemporâneo dos nossos grandes autores. Soube reler os clássicos e os seus contemporâneos com o filtro da ironia e com a inteligência de quem sabe reconhecer a atualidade do passado. Foi até certo ponto grande copista, na melhor tradição de conservação dos tesouros da cultura, e um inovador elegante e genial. Aprender português com Machado é um privilégio acessível a todos. Cito uma passagem de Esaú e Jacó , uma de suas obras que está entre as minhas favoritas, para compartilhar co

QUEM É QUEM NA LÍNGUA

Que pessoas não são números todo mundo sabe, embora a crescente digitalização de nossas vidas esteja codificando quase todos os setores de nossa experiência pessoal. Mas que a personalidade seja um fator fundamental na economia poucos estão explorando ainda. Os economistas George Akerlof e Rachel Kranton investiram no estudo do tema e os resultados podem ser vistos no seu livro: "A Economia da Identidade", traduzido em várias línguas, além do português. O que isso tem a ver com a língua? Em primeiro lugar, a língua e o estilo pessoal de cada um são uma marca que caracteriza a nossa comunicação com os outros e influenciam a percepção que os outros têm de nós. Além disso, a própria língua está sujeita a personalidades fortes, que marcam momentos da história introduzindo novas expressões, revigorando velhas expressões ou gerando termos ligados ao nome próprio. No Brasil, por exemplo, as novelas exercem (muitas vezes no mau sentido) o papel de vetor de novas expressões idio